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A mandioca é um dos alimentos mais tradicionais na cozinha brasileira. Tradição milenar dos povos originários, com o passar dos anos, ela ganhou o Brasil e o mundo.

De acordo com o pesquisador Alessandro Alves-Pereira, em entrevista publicada no site da Capes, a mandioca é “o cultivo alimentício de origem amazônica com maior importância para o mundo”. Para se ter uma ideia dessa importância, ela é a principal fonte de energia para mais de 800 milhões de pessoas.

No entanto, essa cultura tão tradicional e fundamental para a manutenção da biodiversidade e da floresta em pé, também está sob risco. Cultivada no interior da floresta, a mandioca pode desaparecer em função do desmatamento, do avanço da grilagem, da atividade de madeireiros e garimpeiros ilegais, além do agronegócio monocultor.

Felizmente, a partir da bioeconomia e do empreendedorismo de impacto, têm surgido novos modelos de negócio que ajudam a trazer inovação e valorizar a cadeia da mandioca na Amazônia.

A seguir, vamos entender melhor a importância que ela tem para a região e para o País e conhecer iniciativas inovadoras focadas no seu uso. Acompanhe!

A origem e a importância da mandioca na Amazônia

A mandioca é um tubérculo que foi cultivado pelos povos originários da bacia amazônica há milhares de anos, sobretudo na região em que hoje encontra-se o estado de Rondônia. Estima-se que esse cultivo começou há pelo menos nove mil anos.

Com os povos originários, ela espalhou-se por toda a região, alcançando também outros locais na América do Sul e Central. O cultivo simples e a boa adaptabilidade da planta ajudaram neste processo.

“A mandioca é uma planta bem adaptada ao cultivo em áreas marginais com solos de baixa fertilidade, característicos da maior parte da Amazônia. Além disso, ela pode ser consumida em uma grande variedade de formas”, diz Alves-Pereira em entrevista ao G1.

Do tubérculo se faz a farinha, a tapioca, o tucupi, o beiju e tantos outros derivados presentes na dieta não só desses povos, como de boa parte dos brasileiros. Os povos originários ainda a utilizam na produção do cauim, bebida milenar produzida a partir da fermentação da mandioca.

Seguindo a tradição dos povos originários, a mandioca segue tendo papel central nas tradições alimentares, não apenas da região Norte, mas de todo o Brasil.

Leia mais: Qual a importância de fomentar a bioeconomia na Amazônia

O potencial da mandioca para a bioeconomia na Amazônia

A mandioca na Amazônia tem relação direta com as populações originárias e agricultores familiares. Essas comunidades foram as responsáveis não apenas por domesticá-la, mas também por conservar os métodos de produção e a diversidade do cultivo.

Ainda hoje, muitos dos métodos ancestrais de cultivo e processamento da mandioca em seus derivados é mantido pelas comunidades na floresta. Nas chamadas “casa de forno” são construídas do mesmo modo há séculos. Nelas, a mandioca é processada (seca, peneirada, fermentada etc) e transformada em diferentes produtos alimentícios.

O Pará é o maior produtor de mandioca do Brasil. Em 2022, o estado produziu mais de 4 milhões de toneladas do tubérculo.

Na região amazônica, boa parte da produção da mandioca ainda é bastante artesanal, feita por comunidades da floresta. O tubérculo é plantado em setembro para que a colheita seja feita entre maio e junho.

A farinha é o principal derivado comercializado, sendo fonte de renda fundamental para essas pessoas. O escoamento da produção não é fácil, porém. A mandioca é cultivada próxima aos rios e a farinha tem que ser transportada de barco até as cidades mais próximas, que ficam a horas de distância.

A produção da farinha também exige paciência. Para produzir uma saca de 80 kg do alimento, é necessário o triplo de mandioca crua. Na produção artesanal, esse volume é transportado nas costas dos trabalhadores em paneiros (cestos de palha trançada).

Além disso, os produtores costumam passar meses nas casas de forno para transformar toda a mandioca colhida em farinha.

Cultivo ajuda a manter a floresta em pé

A produção da mandioca pelas comunidades tradicionais desempenha um papel fundamental na preservação da floresta. Ela não só ajuda na manutenção da diversidade dos cultivos amazônicos, como mantém a floresta em pé.

Com uma produção baseada em pequenas propriedades com força de trabalho familiar ou comunitária, o cultivo da mandioca na Amazônia também é marcado por ser itinerante. Ou seja, os produtores nunca plantam no mesmo local muitas vezes seguidas, o que ajuda a evitar o esgotamento do solo. E essa técnica tem funcionado há séculos na região.

“Eles abandonam a área atual para deixar a terra descansar e voltam para a área inicial, onde cresceu a floresta secundária. Eles voltam e fazem o mesmo processo: derrubam as árvores, limpam o terreno e plantam novamente ali”, explica Patrícia Chaves de Oliveira, professora da Universidade Federal do Oeste do Pará, ao G1.

Porém, a professora ressalta a importância que a tecnologia e a inovação podem ter para a produção da mandioca na Amazônia, inclusive como forma de melhoria das condições de trabalho e renda dos produtos tradicionais.

Com a “atualização tecnológica, que melhore as condições de trabalho desses povos, é possível aumentar a sua produção e adequá-la ao mercado, valorizando o produto no mercado regional e internacional”.

A fala da professora vai ao encontro das conclusões do relatório Mandioca: entre subsistência e negócio, produzido no âmbito do projeto Amazônia 2030. Segundo o documento, os produtores da Amazônia precisam de aportes tecnológicos ao seu cultivo para que possam competir em outros mercados e aumentar a produtividade.

Essa, aliás, é uma necessidade comprovada por dados. De acordo com a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), o rendimento ideal do cultivo da mandioca deveria ser de 40 toneladas por hectare. No Acre e em Rondônia, a produtividade fica pouco acima das 20 toneladas.

Brasil perde para a Nigéria a liderança na produção da mandioca

E por incrível que pareça, o Brasil não é o maior produtor mundial do seu próprio insumo amazônico. Enquanto a Nigéria lidera a produção, a Tailândia é o maior exportador da mandioca.

Importante dizer que as oportunidades para a cadeia da mandioca vão além do uso alimentício. 

“A cadeia da mandioca só tem a crescer. A gente pode aproveitar absolutamente tudo dela, não se desperdiça nada. As cascas podem servir para ração, adubo do solo; as folhas podem ser trabalhadas para a maniva e a essa maniva pode também ser um produto mais concentrado, desidratado, para ser comercializada em pequenos volumes. Então, são muitas as alternativas para essa cadeia riquíssima presente na Amazônia”, explica a professora Priscilla Andrade, do curso de Ciência e Tecnologia de Alimentos da Universidade Federal Rural da Amazônia (UFRA) ao mesmo site.

As diversas aplicações da mandioca em negócios inovadores

Diante de todo este contexto e das necessidades de melhoria na cadeia produtiva da mandioca na Amazônia, nascem na região diversos negócios da bioeconomia que oferecem soluções que ajudam a valorizar o produto e a floresta em pé.

Um deles é a Apoena Agroindústria. A empresa, localizada no coração do Amazonas, atua na agroindústria e comércio de produtos silvestres amazônicos, como óleos vegetais, farinha de mandioca e de frutas.

Outro case de sucesso é a Manioca. A marca transforma ingredientes da Amazônia em alimentos naturais, desenvolvendo cadeias produtivas que dialogam com a cultura local e sua biodiversidade. A empresa foca na criação e comercialização de produtos naturais e práticos para cozinheiros e consumidores de todo o Brasil, como farinhas, feijões, molhos e temperos com insumos da Amazônia.

A NUU Alimentos, por sua vez, é uma empresa carbono neutro que oferece alimentos sem glúten, entre eles um pão de queijo feito a partir de farinha de mandioca.

Para finalizar, trazemos o exemplo da Belterra. Essa startup atua junto a pequenos e médios produtores, promovendo práticas agroflorestais para recuperação de áreas degradadas (como a implantação de agroflorestas que usam a mandioca).

Negócios como esses mostram o potencial não só da mandioca na Amazônia, mas de toda a biodiversidade da região. Pensando nisso, criamos o e-book A floresta em pé e a bioeconomia na Amazônia, em que exploramos mais a fundo os conceitos, sua relação e o potencial econômico das cadeias da região. Baixe agora!